Violência Financeira de Dantas Supera a da Polícia
Pedro do Couto - Tribuna da Imprensa - 12/08/2008
http://www.tribuna.inf.br/pedro.asp
Pedro do Couto
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No seminário realizado dia 4 de agosto pelo "O Estado de S. Paulo", cujas conclusões foram publicadas no dia seguinte em vários jornais, o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo, afirmou-se preocupado com as ações das autoridades policiais, no episódio Daniel Dantas, voltadas para um espetáculo - frisou - destinado a garantir espaço no JN da Rede Globo.
Gilmar Mendes condenou o uso de algemas usadas nos ladrões de casaca e defendeu uma legislação para controlar a atuação da Polícia Federal. Além disso, propôs a criação de Varas Especiais na Justiça para julgar casos de abuso de autoridade. Participaram do painel o ministro Tarso Genro, o presidente da OAB, Cezar Brito, e o procurador geral da República, Antônio Joaquim de Souza. Ninguém, na verdade, pode defender a violência policial ou militar, a exemplo do que ocorreu no Brasil nos anos de chumbo. Mas devemos considerar que não existe apenas este tipo de violência.
Existe a violência econômica. Existe a violência financeira, caso no qual o enigmático Daniel Dantas se enquadra mais que amplamente. Uma violência sem limites, como até os casos de tentativa de suborno comprovam. Dois emissários do banqueiro, Humberto Braz e André Chincaroni, encontram-se presos pela tentativa de suborno ao delegado Protógenes Queiroz. Um caso, como se vê, gravíssimo. Tão grave que o presidente do STF negou habeas-corpus a estes dois personagens. Estão presos. Não sei por quanto tempo, mas estão presos.
A violência policial atinge os direitos humanos, sem dúvida, isso, porém, nos casos em que ela pode ser evitada. O uso das algemas nos ladrões de casaca é de fato dispensável. Eles não são fisicamente violentos. Sua agressividade reflete-se no plano das leis que violam todos os dias. Por isso, acho que o ministro Gilmar Mendes deve voltar sua atenção também para este plano, para este aspecto. Sobretudo porque os prejuízos financeiros decorrentes são infinitamente maiores que os causados pela ruptura dos limites policiais adequados. O desrespeito à lei é mil vezes maior. Sem dúvida alguma. Vou dizer por quê.
Uma das acusações mais fortes contra Daniel Dantas é a evasão de moeda brasileira para o exterior, através de doleiros, e sua acumulação em paraísos fiscais. De onde retornam, para o mercado financeiro nacional, como se fossem recursos de investidores estrangeiros. Na operação, está configurada a perda de divisas, quanto à sonegação fiscal. Violação indiscutível da lei brasileira. Em setembro de 1962, governo João Goulart, entrou em vigor a Lei 4.131, lei de remessa de lucros à qual me referi na coluna de primeiro deste mês. No seu artigo 2º, mantido pela Lei 4.390 de agosto de 64, texto este de autoria de Roberto Campos, foi mantida a seguinte determinação:
"Ao capital estrangeiro que se investir no País será dispensado tratamento jurídico idêntico ao concedido ao capital nacional, em igualdade de condições, sendo vedadas quaisquer discriminações não previstas na presente lei".
Citado no artigo de 1 de agosto, meu amigo Gilberto Paim, o verdadeiro autor do projeto original do deputado Sérgio Magalhães, Lei 4.131, em recente almoço comigo pede atenção para a Lei 4.390. Deseja mostrar que Roberto Campos, primeiro-ministro de Castelo Branco, não acabou com as restrições à remessa de lucros. Tornou a saída de capital em vinte por cento mais elástica, mas instituiu, dependendo do montante remetido, um imposto variável de 15 a 25 por cento. Este limite está sendo respeitado hoje? A incidência do imposto está de fato incidindo? Eis aqui duas boas perguntas para o ministro Guido Mantega e para o presidente do Banco Central, Henrique Meireles.
Importantes as respostas. Isso porque a legislação não mudou. Tanto não mudou que a Medida Provisória 2.224/2001, do presidente Fernando Henrique, ainda não transformada em lei de conversão pelo Congresso até hoje, cita especificamente o artigo 2º da 4.131 mantido pela 4.390. Entretanto, não por lei, mas por resolução, o Banco Central adota critério diferenciado para as aplicações externas no mercado financeiro nacional. Bom tema para o procurador geral Antônio Joaquim de Souza.
Se o Banco Opportunity, através dos fundos que possui ou opera, envia para o exterior recursos que voltam ao País como estrangeiros, logrando com isso isenções fiscais e tributárias, está agindo contra a legislação brasileira. Não pode haver outra interpretação. Caso não esteja infringindo a lei e a ordem, deve explicar claramente qual a sua verdadeira engrenagem.
Na hipótese de desencadear atividades ilegais, entre elas a tentativa de suborno, evidentemente o Esquema Daniel Dantas está agindo com extrema violência contra os próprios interesses do País. Tal violência, não há como refutar, é muito maior do que a da Polícia Federal ao colocar algemas no nebuloso protagonista de tantas tramas e traumas.
Por isso tudo, penso que o ministro Gilmar Mendes não deve restringir suas preocupações somente quanto ao aspecto formal da ação da polícia, mas principalmente deslocar seu pensamento também para o universo sofisticado dos crimes de colarinho branco e casaca que causam prejuízos ao Brasil de muitos bilhões de dólares. Afinal de contas, inclusive, são crimes continuados que se repetem há quase duas décadas. O dinheiro sai, o dinheiro volta, a Receita Federal nada arrecada. A corrupção prossegue. Numa velocidade de milhares de dólares por hora.
Enquanto isso, no Brasil, os juros sobem. A economia desce. Mas os juros altos - afirmou Delfim Neto ao "Jornal do Commercio", edição do dia 5 - não garantem o controle da inflação. Não garantem mesmo. Só a produção dinâmica em busca do mercado interno é capaz disso.
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