Transtorno Bipolar é doença pouco conhecida,
mas afeta diretamente o rendimento profissional
Crises de  depressão, momentos de angústia e tristeza. "Durante dez anos vivi angustiada e  me incomodava lembrar dos momentos felizes", declara C.E.K, analista de  laboratório. Com o início do tratamento, com uma psicóloga e um psiquiatra, foi  possível conquistar a estabilidade e a vontade de acordar no dia seguinte. "Hoje  encaro minha doença bem. Meus colegas de trabalho sabem que sofro dela e lidam  bem com isso", afirma. C.E.K é vítima do Transtorno Bipolar (TB), uma doença  pouco conhecida, mas de efeitos avassaladores tanto na vida pessoal, quanto na  profissional.
Segundo Teng  Chei Tung, psiquiatra e integrante do Grupo de Doenças Afetivas, do Instituto de  Psiquiatria do Hospital das Clínicas, o transtorno bipolar geralmente se  manifesta de forma depressiva. A pessoa fica retraída, perde auto-estima, sente  muita tristeza e corre o risco de cometer suicídio. "A maioria dos pacientes vem  deprimida e alguns deles me procuram porque estão irritados, ansiosos,  explosivos", explica. "Depois de analisá-los vejo que eles oscilam, têm momentos  para baixo e para cima, ou seja, apresentam características de transtorno  bipolar", avalia Tung.
Essa  oscilação era sentida por C.E.K. "Era uma angústia muito grande, uma vontade de  ficar trancada dentro de casa. Em outros momentos, até há energia, mas o pique é  diferente, pois varia demais", lembra.
Na fase eufórica, também denominada mania, a pessoa é  hiperativa, sente-se muito bem, com auto-estima elevada e apresenta grande  tendência à distração. Um baita problema para o ambiente profissional. Mas não o  único. "Na fase eufórica, o paciente com transtorno bipolar pode também causar  diversos problemas no trabalho, pois ele quer participar de tudo, se intromete  no trabalho dos outros e sempre acha que ele é quem está certo, chegando a  brigar com colegas e chefes", aponta o  psiquiatra.
O agravante  disso tudo é que, no dia seguinte, essa mesma pessoa hiperativa pode aparecer  depressiva, sem ânimo para trabalhar e absolutamente reclusa. Lidar com essa  montanha-russa é complicado não apenas para quem a tem, mas para quem precisa  conviver com esse indivíduo.
As origens da doença ainda não foram identificadas, mas  sabe-se que sua base é genética e que um tratamento adequado envolve  medicamentos - denominados "estabilizadores do humor" - e acompanhamento  psicoterápico. "O transtorno bipolar varia em diversos sentidos, como ritmo  biológico e físico, a pessoa não consegue acordar cedo, provoca mudanças de  apetite. No estado de euforia, a pessoa fica agitada e, quando está em  depressão, ela fica lenta. Mas pode também flutuar de uma forma não em bloco,  estando triste e agitada ao mesmo tempo", aponta Tung. O tratamento do  transtorno bipolar visa, assim, ajudar o paciente a ter uma vida o mais normal  possível, reduzindo a freqüência e a gravidade das crises (de depressão e de  mania).
Como  lidar?
O fato dos sintomas  do TB se confundirem com outros distúrbios psíquicos torna difícil um  diagnóstico preciso da doença. E não é raro uma pessoa ser enquadrada como  portadora de depressão unipolar e passar anos sendo tratada como tal. Mas, se  ela tem fases de euforia e o tratamento não responde a anti-depressivos, "é um  sinal de que ela possa ter TB", avalia Tung. Foi o que ocorreu com C.E.K, cuja  bipolaridade se expressa mais em depressão, mas tem fases de euforia. "Eu já  estava tomando um antidepressivo há um tempo e não via efeito", lembra a  analista de laboratório. Segundo o psiquiatra, cerca de 50%  das pessoas com depressão são bipolares.
Além de medicamentos, é indicado que a pessoa com TB tenha  o acompanhamento de um psicólogo. "A medicação que eu tomo me deixou estável e é  a terapia que me proporciona um autoconhecimento para me entender melhor e  seguir adiante, para saber lidar com meu comportamento, com situações que possam  colocar meu emocional em risco", avalia.
E, assim como qualquer tratamento terapêutico, contribui  para o alcance de resultados o apoio de familiares e colegas de trabalho. Em seu  emprego, por ser flexível e aberta a diálogos, C.E.K não chegou a ter problemas  de relacionamento, mas assim que constatou o TB, a analista optou por revelá-lo  aos poucos aos colegas, algo que auxiliou o tratamento. "Procuro fazer com que  as pessoas entendam que não é nada pessoal com elas, mas um desequilíbrio  químico em mim que vai passar em breve",  ressalta.
Nos momentos de crise, sejam elas eufóricas ou depressivas, vale  ressaltar a importância do RH da empresa conhecer a doença para melhor orientar  os gestores - e equipe - a lidar com seu colaborador. E, mesmo que a  doença não tenha sido diagnosticada, é recomendável que o RH a conheça para que  possa sugerir a seu colaborador a busca por ajuda médica e auxiliá-lo da melhor  maneira possível. Afinal, nessas crises, o paciente encontra-se num momento  difícil de sua vida, podendo apresentar riscos, tais como exposição a situações  vexatórias, de suicídio, prejuízo no funcionamento social, profissional e  psicológico.
Para Tung,  muitas vezes a pessoa só enxerga a fase da depressão, a fase em que está muito  irritada. "Então ela tenta se controlar e acaba não procurando ajuda", afirma.  E, mesmo quando a doença é diagnosticada, outros obstáculos vêm à tona: é  preciso lidar com o preconceito e a falta de informação da sociedade como um  todo. "A minha impressão é que as pessoas ouvem muito falar da doença, mas não a  entendem. Outras se identificam com algumas situações, sem conhecer de fato a  doença", aponta Tung, que escreveu o livro "Enigma bipolar - Conseqüências,  diagnósticos e tratamento do transtorno bipolar" (MG Editores) com o objetivo de  esclarecer essas dúvidas.
Veja alguns sintomas das duas fases de um paciente  TB:
Mania
- humor para cima, exaltação, alegria, otimismo e  autoconfiança exagerados;
-  irritabilidade, impaciência, agitação, inquietação física e  mental;
- aumento da  energia, da produtividade: a pessoa inicia muitas atividades e não consegue  terminá-las;
- achar que  possui dons ou poderes especiais de influência, grandeza e  poder;
- fácil  distração;
- insônia,  redução da necessidade de sono.
 
Depressão
- angústia ou sensação de vazio, humor para baixo, tristeza  profunda;
- pessimismo,  idéias de culpa, fracasso, inutilidade;
- pouca ou nenhuma capacidade de sentir prazer e alegria na  vida;
- sentimentos de  insegurança, baixa auto-estima, medo;
- irritabilidade, desespero;
- desânimo, preguiça, falta de energia física e  mental;
- falta de  concentração, lentidão do raciocínio, memória  ruim;
- falta de vontade,  falta de iniciativa e interesse, apatia;
- redução da libido;
- perda ou aumento de apetite e/ou  peso;
-  insônia ou dormir demais, sem se sentir repousado.