Os Gays Que Envergonham os Gays
Adriano Silva - Revista Época nº 526 de 16/06/2008
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI5891-15230,00-OS+GAYS+QUE+ENVERGONHAM+OS+GAYS.html
Sempre achei que quem sofre preconceito estaria para sempre livre do risco de impingir preconceito. Como se pertencer a uma minoria discriminada criasse no sujeito anticorpos que o impedissem de discriminar. Eu sou ingênuo. O mundo está cheio de negros que espancam mulheres, mulheres que esganam crianças, judeus que desejam uma solução final para a questão palestina. Ao que parece, basta pertencer à espécie humana para carregar no coração uma bomba de ódio e intolerância prestes a explodir. Percebi que era assim há uns anos, quando um amigo gay e francês declarou seu voto à ultradireita da França. Seu argumento: Eram os únicos capazes de expulsar árabes e africanos de Paris. Outro amigo olhou para ele e disse: "Legal. Só que, depois dessa faxina, sabe qual o próximo entulho que eles vão remover? Os gays. Esteja preparado". Touché!
Eu não imaginava que um sujeito pudesse ser gay e conservador ao mesmo tempo. Pensava que, ao romper com um tabu, ao desafiar ditames da sociedade, ao se tornar liberal numa área da vida, o sujeito estivesse automaticamente se libertando em todos os outros campos. Não é assim que funciona. Nem todo gay, ao sofrer represálias por sua escolha, passa a simpatizar com pessoas em condição similar. Às vezes, a ausência de empatia floresce dentro do próprio universo gay. Ou seja: há gays com forte preconceito contra outros gays.
É como se houvesse uma escala social entre os gays, uma graduação quase hierárquica: Numa ponta os gays "aspiracionais", que orgulham a classe, que todos gostariam de ser e, na outra extremidade, os gays que envergonham a categoria, de quem todos querem distância. Perceba que uma régua dessas, feita para medir e prejulgar, aproxima muito a turma colorida, chacoalhante e seminua das paradas gays das comedidas senhoras de anágua que tomam chá em respeitáveis clubes espalhados pelo interior do Brasil e do mundo.
Há uma espécie de escala social entre os gays, dos "aspiracionais" aos que envergonham a "categoria".
Talvez os gays mais admirados sejam os que não alardeiam sua escolha, que só saem do armário num círculo íntimo, sem deixar de seguir padrões masculinos em sua opção. Talvez os gays mais apedrejados pelos outros gays sejam os afeminados, os travestis. Aqueles que tornam explícita sua negação aos padrões hegemônicos – e até debocham um pouco deles. Os gays à moda grega, que gostam de homens exatamente porque não têm apreço pelo sexo feminino, porque têm asco de vagina, detestam os gays afeminados. Estes, ao contrário, idolatram as mulheres a ponto de tentar mimetizá-las com seus trejeitos e de, talvez, desejar ter uma vagina. Mas, se a liberdade sexual deve ser ampla o suficiente para permitir que um homem decida amar outro homem, por que uma escolha secundária como usar um mocassim ou um salto alto deveria ter tamanha importância?
Ao determinar que uma opção é menos digna que a outra, os gays masculinos fazem um julgamento invasivo, reproduzem a discriminação a que são submetidos e tratam os gays femininos precisamente como são tratados. Isso lembra os escravos que, para ser aceitos na casa-grande, viravam feitores e chibatavam para valer outros escravos.
Os gays masculinos argumentam que o comportamento dos gays afeminados é sempre agressivo. E que dar bandeira dessa forma ostensiva não colabora com a causa gay: afasta e assusta possíveis interlocutores. Esse é um raciocínio utilitário e casuístico, que não dá conta da ofensa à liberdade individual perpetrada exatamente por quem é vítima dela.
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Toda e qualquer discriminação deve ser combatida. Drauzio Milagres.
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