O Dinheiro Nunca Dorme
Susan Andrews - Revista Época nº 485 de 03/09/2007 - página 67
Num mundo em que escândalos repugnantes vêm à tona a cada dia, quando até mesmo nossos heróis outrora imaculados, os astronautas, vão para o espaço embriagados, cabe a nós pausar para refletir sobre o que mobiliza a ética no coração humano. E o que a impede.
Como escrevi na última coluna, os neurocientistas estão agora corroborando os grandes filósofos morais Arthur Schopenhauer e David Hume. Descobriram, em experimentos de imagens cerebrais, que nossas decisões éticas emergem não de um raciocínio utilitário, mas de sentimentos universais.
Sentimentos, freqüentemente inconscientes, de empatia pelos outros seres. A essência da ética, então, está no cultivo dessa tendência natural pela compaixão.
Porém, Schopenhauer se deu conta de que temos outras motivações menos nobres, como a busca pelo próprio bem-estar em primeiro lugar (o egoísmo) e o desejo de fazer mal a outras pessoas (a malícia). Ser ético, então, significa esforçar-se para que a compaixão transcenda o egoísmo e a malícia.
O filósofo inglês Bertrand Russell ponderou sobre que tipo de sociedade cultivará a compaixão em detrimento da malícia. Segundo ele, é a competição pelos recursos materiais que faz com que os impulsos possessivos nos seres humanos predominem sobre o que ele chamou de impulsos criativos. "Poucas pessoas podem ter êxito sendo criativas em vez de possessivas num mundo que é totalmente baseado na competição; onde a honra, o poder e o respeito são dados à riqueza, e não à sabedoria; onde a lei consagra a injustiça daqueles que têm contra aqueles que não têm".
Hal Steger, um executivo de marketing no Vale do Silício, na Califórnia, vive num mundo permeado pela competição. Dono de uma casa avaliada em US$ 1,3 milhão com vista para o Oceano Pacífico, com mais de US$ 2 milhões na conta bancária, seu patrimônio o coloca entre os 2% das famílias mais ricas dos Estados Unidos. Mas ele está longe de se sentir satisfeito. Trabalhando 12 horas por dia, e mais dez horas por fim de semana, ele lamenta: "Alguns milhões não representam tanto quanto antigamente".
Até mesmo os membros da "elite digital", cujas vidas são ricas de oportunidades e prazeres, não se acham assim tão afortunados, porque estão rodeados de pessoas que têm muito mais. Um executivo explica: "Quando um gestor de fundos de investimento pode ganhar US$ 1 bilhão por ano, todos aqui olham para as pessoas que estão acima deles. Com US$ 10 milhões, você não passa de um zé-ninguém". E um outro ainda confessa: "Aqui, dos que estão entre os top, 1% quer se tornar os top 0,1%, e os top 0,1% querem chegar aos top 0,01%. Você até tenta não cair nessa roda viva, mas é difícil evitar".
Bertrand Russell alertou: "Num ambiente assim, até mesmo aqueles cuja natureza é dotada de grandes dons criativos se tornam infectados pelo veneno da competição. Um halo de quase idealismo se espalha a partir do impulso central da ganância".
Lembremos do famoso discurso do personagem Gordon Gekko, no filme Wall Street – Poder e Cobiça, baseado na vida real de inescrupulosos investidores, como Ivan Boesky. Gekko afirma: "O ponto é, senhoras e senhores, que ganância faz bem. Ser ganancioso está certo, a ganância funciona". Gordon Gekko em breve reaparecerá num filme continuação, com o título Money Never Sleeps ("Dinheiro nunca dorme"). Pode ser que o dinheiro nunca durma, mas quando é que nós iremos acordar? Será que o barulho do mercado financeiro global chacoalhando é um toque de despertar?
Infelizmente, por causa do dinheiro, pessoas passam por cima de valores, da ética, de princípios e de qualquer outra coisa. Um abraço. Drauzio Milagres.
ResponderExcluirBoa tarde, Dráuzio. Excelente texto.
ResponderExcluirO dinheiro em si pode fazer coisas muito boas, depende de quem o usa.
O importante é lembrarmos sempre de que não levaremos nada de material daqui conosco... e que as ilusões podem ser bonitas, mas mordem.
Abraços !
Sem a menor dúvida Ana. "Depende de quem o usa". Um abraço. Drauzio
ExcluirO dinheiro dá poder e o poder revela o homem,então,depende de quem o usa.
ResponderExcluirCom admiração,Crista.