Os acontecimentos ocorridos nos últimos meses dentro da Igreja Romano Católica fazem suscitar a questão do risco de esta assumir claramente comportamentos de seita. Bento XVI está imprimindo um curso perigoso à Igreja Católica, provocando severas críticas não apenas de teólogos mas de cardeais, de inteiros episcopados, como o da França, de grupos de bispos da Alemanha e, espantosamente, de bispos da romaníssima Itália, além de outros líderes religiosos e de organismos ecumênicos mundiais.
Desde seu tempo de Cardeal, tem tratado os grupos progressistas e os teólogos da libertação a bastonadas e com pele de pelica os conservadores e tradicionalistas, seguidores do Bispo Lefèbvre, excomungado em 1988 e que, à revelia de Roma, ordenou bispos e padres. O Vaticano acabou por acatar seus seminários onde formam o clero no rito tradicionalista. E agora acaba de atender a uma de suas demandas maiores: Voltar à missa em latim do Concílio de Trento (1545-1563) com todas as limitações históricas, hoje inaceitáveis. Aí se reza "pelos pérfidos judeus" para que aceitem Jesus como Messias.
O mais grave ocorreu logo em seguida com a publicação de cinco questões sobre a igreja, oriunda da Congregação da Doutrina da Fé e aprovada pelo Papa, na qual se repete o que o então cardeal Joseph Ratzinger, em 2000, enfatizava no documento Dominus Jesus, verdadeiro exterminador do futuro do ecumenismo: A única Igreja de Cristo subsiste somente na Igreja Católica, fora da qual não há salvação. As demais "igrejas" não o são pois possuem apenas "elementos eclesiais" e a Igreja Ortodoxa, tida como uma expressão da catolicidade, foi rebaixada a simples igreja paticular. Estas posições reacendem a guerra religiosa quando todos estão buscando a paz, cuja realização é enfraquecida pela Igreja.
A Igreja está se isolando mais e mais de tudo. Sua base social são principalmente os movimentos, medíocres no pensamento e subservientes às autoridades; preferem a aeróbica de Deus a confrontar-se com os problemas da pobreza e da injustiça. Uma Igreja se comporta como seita, segundo clássicos como Troeltsch e Weber, quando tem a pretensão absolutista de deter sozinha a verdade, quando se nega ao diálogo, rejeita o trabalho ecumênico e manifesta crescente autofinalização.
Nesse sentido, cabe lembrar que o Vaticano não assinou, em 1948, a Carta dos Direitos Humanos, se recusou entrar no Conselho Mundial de Igrejas, porque se julga acima e não junto das demais Igrejas, negou-se a apoiar a convocação de um Concílio universal de todos os cristãos na perspectiva da paz mundial, sob o pretexto de que cabe exclusivamente a Roma fazê-lo, proibiu a compra dos cartões da Unicef destinados à infância carente, alegando que esta entidade favorecia o uso de preservativos.
Ao lado disso, cresce o patrimônio imobiliário da Igreja que, segundo pesquisas (Adista 2/6/07), chega a um quinto de todo o patrimônio italiano e romano. A especulação imobiliária e financeira rendeu ao Vaticano, entre 2004-2005, 1,47 bilhões de Euros.
A estratégia doutrinal do atual Papa é a do confronto direto com a modernidade, num pessimismo cultural inadmissível em alguém que deveria saber que o Espírito não é monopólio da Igreja e que a salvação é oferecida a todos.
Não causaria espanto se alguns mais radicais, animados por gestos do atual Papa, tentassem um cisma na Igreja. No século IV, quase todos os bispos aderiram à heresia do arianismo (Cristo apenas semelhante a Deus). Foram os leigos que salvaram a Igreja, proclamando Jesus como Filho de Deus. É urgente atualizar esta história, dada a estreiteza de mente e o vazio teológico reinante nos altos escalões da Igreja.
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