Homossexuais Idosos
Wálter Fanganiello Maierovitch - Revista Carta Capital nº 482 de 13/02/2008
http://www.cartacapital.com.br/app/coluna.jsp?a=2&a2=5&i=72
Wálter Fanganiello Maierovitch - Revista Carta Capital nº 482 de 13/02/2008
http://www.cartacapital.com.br/app/coluna.jsp?a=2&a2=5&i=72
A Alemanha saiu na frente e o governo do presidente Lula deveria aproveitar a idéia, que está sendo aplaudidíssima em toda a Europa. Conforme entidades de prestígio internacional dedicadas aos direitos humanos, a iniciativa alemã tende a se multiplicar pelo planeta.
A atitude do governo da premier Angela Merkel pode até ser vista como um ato a redimir um passado de horrores. Isto em um país que proibia, pelo inesquecível parágrafo 175 da Constituição de 1935, as relações homossexuais. Durante o regime nazista, Hitler, com base no parágrafo 175 do texto constitucional, perseguiu, esterilizou e exterminou homossexuais.
Com efeito, num prédio de apartamentos da berlinense Asta-Nielsen Strasse, número 1, bairro de Pankow, começou a funcionar, neste fevereiro de 2008, a primeira casa de repouso e tratamento destinada a abrigar gays e lésbicas entrados na terceira idade.
No momento, são 28 quartos com assistentes sociais e enfermeiros selecionados entre homossexuais. Por evidente, a diretora responsável pelo estabelecimento é lésbica.
Enfim, um humano e sensível toque cor-de-rosa de cidadania, em um mundo onde os passantes ainda não apreenderam a conviver com as diferenças. E em que o preconceito ainda impera, quando não se deveria esquecer a perseguição processual nazista a mais de 100 mil gays, com 15 mil enviados aos campos de extermínio e dos quais apenas 4 mil sobreviveram ao Holocausto.
É interessante notar que a geração daqueles acolhidos em Berlim também teve, como tantos outros espalhados pelo planeta, de levar uma vida de fachada. No Brasil, é significativo o mote da marchinha carnavalesca Maria sapatão, sapatão, sapatão. De dia é Maria, de noite é João.
Ao traçar o perfil dos abrigados, a diretora da supracitada primeira casa de repouso para homossexuais concluiu tratar-se de pessoas que, pela pressão social, "viveram vida dupla", no que toca à exteriorização da sexualidade.
A merecer a reflexão, em especial pela direita tedesca, que reagiu e considerou a iniciativa discriminatória e a servir apenas para isolar ainda mais os gays e as lésbicas, a diretora da Casa de Repouso foi ao ponto. Para ela, os idosos homossexuais precisam de um lugar para falar dos seus amores, das suas experiências e, também, para verbalizar seus traumas. E, sem dúvida, nada melhor do que um local adequado, com funcionários preparados à interlocução.
Um dos atendentes da Casa de Repouso frisou que nenhum homossexual da clínica precisará mais olhar ao redor primeiro para, então, beijar um visitante seu. Em uma referência a um tempo hipócrita, em que o homossexual acionava intuitivamente freios inibitórios para evitar aquilo que escandalizava conservadores, como o beijo na boca.
O endereço da casa de repouso, no bairro de Pankow, é dado como provisório. Todos pensam em um prédio de oito pavimentos, já com negociações abertas, em Nollendorplatz, que é o coração do mundo gay de Berlim. Pelas estimativas, Berlim conta com 4 mil homossexuais.
Os moralistas protestam contra a futura transferência e, para disfarçar, falam em auto-imposta discriminação, como a se isolar num ambiente protegido, num retorno à guetização. Para os liberais, que falam em libertação também na velhice, o ideal seria a implantação de clínicas similares, de repouso e tratamento, no Village, em Nova York, e no Soho de Londres, ambos redutos gays.
A proposta de gestão para a clínica em Nollendorplatz é interessante. O ancião poderá, como regra, levar para o apartamento os seus guardados, tais como cartas, fotos, diários e livros. E haverá lugar para móveis e peças decorativas que lhe marcaram a lembrança.
A meta é que cada um continue a administrar as próprias contas e despesas, com funcionários a atuar apenas em auxílio e quando solicitados.
Na inauguração, um gay que sobreviveu a um campo nazista de extermínio brincou ao falar já saber o que fará quando envelhecer.
A clínica para repouso de homens e mulheres homossexuais é uma iniciativa que tardou a surgir. Na verdade, a Alemanha devia uma resposta bem antes. O parágrafo 175 da Constituição de 1935 prevaleceu até 1994, ou seja, até bem depois da queda do Muro de Berlim.
Sob o regime nazista, Hitler logrou alterar o artigo de modo a ampliar a proibição. Queria incluir beijos, abraços e exteriorizações de comportamento duvidoso. A pena de castração ou esterilização passou, em 1942, para a de morte. Nos campos de extermínio, os gays, para identificação, usavam uniforme com um triângulo colorido desenhado e com a base virada para cima.
Um dos documentários premiados no Festival de Berlim de 2000 contou a vida de cinco gays sobreviventes de um campo de extermínio. O título era emblemático: Paragrah 175.
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Um grande avanço para a segurança e qualidade de vida das pessoas quando chegam na terceira idade.
ResponderExcluirVale a pena ler.
Um abraço.
Drauzio Milagres