Sacha Van Loo, 36, não é um policial comum. Ele carrega uma bengala branca, em vez de uma arma. E, pelo barulho de um motor em uma gravação, pode discernir se um suspeito está dirigindo um Peugeot, um Honda ou uma Mercedes. Van Loo é uma das novas armas da Europa na luta global contra o terrorismo e o crime organizado: um Sherlock Holmes cego, cuja deficiência o permite encontrar pistas que os outros detetives não vêem. "Ser cego me forçou a desenvolver os outros sentidos, e minha força como detetive está em meus ouvidos", diz ele de seu escritório na Polícia Federal Belga.
Van Loo, homem magro que nasceu cego, é um dos seis policiais cegos na unidade pioneira especializada na transcrição e análise de gravações de grampos em investigações criminais. Lingüista que aprendeu servo-croata por diversão, ele lamenta não ter o direito de carregar uma arma no serviço nem de fazer prisões. Mas seu sentido de audição é tão agudo que Paul Van Thielen, diretor da Polícia Federal Belga, compara seus poderes de observação aos de um "super-herói".
Quando a polícia escuta um suspeito de terrorismo fazendo uma ligação, Van Loo pode ouvir os tons discados e imediatamente identificar o número. Ao ouvir o eco da voz nas paredes, ele deduz se o suspeito está falando de uma sala de aeroporto ou de um restaurante lotado. "Tive que treinar meu ouvido para saber onde estava. É uma questão de sobrevivência para atravessar a rua ou entrar em um trem", disse ele.
"Algumas pessoas podem se perder no barulho de fundo, mas como sou cego, divido a audição em diferentes canais. São esses detalhes que podem ser a diferença entre resolver ou não um crime". Sua deficiência, diz ele, também lhe deu a força emocional para lidar com o estresse do trabalho. "Ouvi criminosos planejando assassinato, traficantes fazendo planos de entregar drogas, homens brigando. Ser cego me ajuda a não me deixar afetar porque tenho que ser duro".
A unidade cega de polícia, que entrou em operação em junho, originou-se após Thielen ouvir falar de um policial cego na Holanda. Ele estava procurando formas de melhorar a integração com a comunidade e fez a conexão de que os cegos podem se provar mais adeptos a ouvir e interpretar grampos do que quem vê. A idéia, diz ele, ganhou força após o governo belga aprovar uma lei há alguns anos dando à polícia maiores poderes de usar grampos na investigação de 37 áreas de crime, incluindo terrorismo, homicídio, crime organizado e seqüestro de menores.
A polícia também reconheceu que policiais cegos como Van Loo poderiam ser particularmente valiosos em investigações de combate ao terrorismo, porque as gravações de grampos de ligações telefônicas ou de microfones colocados nas casas de terroristas, muitas vezes são abafadas por fortes barulhos de fundo, requerendo um ouvido altamente treinado para discernir as vozes. Além de seus ouvidos altamente desenvolvidos, Van Loo também é tradutor treinado que fala sete línguas, inclusive russo e árabe - um talento que o torna indispensável, segundo Grignard. "Você precisa de todos os recursos em uma investigação de terrorismo, e um policial cego poliglota pode ser uma arma poderosa".
A polícia belga ficou impressionada com o número de cegos que se inscreveram para as vagas. Altas notas nos testes de audição foram pré-requisito para o cargo, como ter no mínimo 33% de cegueira. Van Thielen se lembra que o recrutamento de cegos teve outros desafios. Como eles seriam usados quase exclusivamente para investigações de grampos, e a força não queria expô-los a situações de perigo, receberam um status especial sob a lei de 2006 para trabalhadores forenses que dá aos civis alguns poderes de polícia, mas os proíbe de fazer prisões ou carregar armas. Van Thielen também enfrentou resistência de outros veteranos da força, que achavam que ter colegas cegos seria um fardo. Outros não sabiam como se comportar na frente de cegos. Para acalmá-lo de suas preocupações, Van Thielen criou sessões de treinamento especiais com voluntários cegos. "No princípio, quando os membros da polícia ouviram que cegos iam trabalhar ali, riram e me disseram que éramos uma força policial, e não uma obra de caridade", disse Van Thielen. "Mas a postura mudou quando os policiais cegos chegaram e mostraram sua determinação de trabalhar duro e de serem úteis".
Quando Van Loo transcreve uma gravação, usa fones de ouvido e passa o dedo indicador em uma longa faixa de caracteres em braille na base do teclado, cujos caracteres se alteram para replicar o que está na tela, desligada. Quando ele sai, carrega um aparelho de GPS da polícia, com voz que o dirige ao destino, rua por rua. Cindy Gribomont, diretora de treinamento da Liga de Braille de Bruxelas, instituto para cegos que ajudou no recrutamento da polícia, diz que superar os preconceitos dos empregadores é seu maior desafio. "Os empregadores precisam ser estimulados, porque têm medo de empregar pessoas com deficiências."
Van Loo, de sua parte, diz que continua determinado a não deixar sua deficiência dominá-lo. "Ser cego não é sempre muito fácil", disse ele. "Não me concentro nisso. Não nego tampouco. É trágico, contudo, que um policial cego seja visto como exceção".
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Essa é uma forma inteligente de se aproveitar o que cada um tem de melhor, o potencial que todos nós temos. Drauzio Milagres.
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